Porque compartilhar é preciso

Olha, pessoal, nós, de humanas, gostamos de falar, mas algumas coisas eu preciso escrever. Não quero chatear ninguém contando histórias pessoalmente ou em vídeos do instagram. Assim, quem quiser, lê, vai que aproveita alguma coisa. 
Fiz a segunda maratona. E eu quero compartilhar a nova experiência. Ué, já não correu a maratona? não é nova. É, sim. Não imaginam como é diferente. Agora entendo. 
Quem leu meus posts de treinamento para a maratona de Buenos Aires e o relato final sabe que eu fui seguindo o plano, ou seja, tem uma periodização de treinamento, que é o treinador que define a partir de muitas variáveis. Há treinos de todo tipo, mas especialmente os chamados longos. 
Naquele momento, o negócio é descobrir que você pode correr uma distância maior do que já fez na vida. E você consegue. Poxa, mas eu não corro nem 5km ainda, e você fez 42?!! Não, eu fiz 42.195, e eu comecei correndo dez minutos, o que não dava nem 2km. Ninguém começa correndo isso tudo, tirando Forrest Gump.  
Mas o dia em que treinei 24km, eu chorei, porque nunca tinha passado de 21. Depois nos 28, chorei de novo, e nos 30, e nos 34. chorei tanto que não sobrou choro para  o fim da maratona, quando eu corri 8km a mais do que meu treino mais longo, e isso é, sim, sensacional!
Essa emoção da primeira vez, não há mais. Nunca mais. Agora são novas emoções. e novos desafios.
Porque agora eu já sabia que conseguia correr mais de 42km (bem pouquinho mais). Isso significou que eu podia estabelecer novo desafio, de reduzir meu tempo de conclusão na prova. Correr mais rápido a mesma distância.
E aí começa a periodização. 
Ano passado deu tudo certo. Sabe tudo certo?  Foi um ciclo sem contratempos, nem frio congelante fez. Mesmo viajando em julho, foi no momento certo, e eu cumpri toda a planilha sem qualquer grande dificuldade além das inerentes ao fato de que tem que treinar, comer direito, suplementar, no meio da vida normal de trabalhar, ser mãe, esposa, etc. 
Agora sei que tive sorte de principiante. 
Tive canelite em abril deste ano. Eu pretendia fazer a maratona em julho. Seis semanas sem correr me fizeram recalcular a rota e prorrogar um mês a prova, porque desistir de maratona  não era uma opção. 
Além de ficar sem correr, o retorno não é com a velocidade anterior, porque dá medo. E eu estava rápida antes da lesão, no dia que já estava praticamente certa de que estava lesionada fiz 5km na meia maratona de BC com pace inferior a 5'. 
Depois disso, eu não fiz nenhuma meia maratona em um bom tempo. Ano passado na mesma época eu estava batendo RP em meia maratona. Faz parte. Foquei na maratona e na dedicação e na fé. 
Fez muito frio este ano para meus padrões. Na meia de BC de julho, estavam 5 graus na largada, e 10 na chegada, foi um horror, eu não nasci para isso. Muitos dias de muito frio de manhã cedo, sofrimento. 
 Até tive sorte que não choveu em dias de treino de tiros, que eu ia até BC porque é mais fácil de percorrer a distância plana sem rua pelo caminho. No dia que choveu e eu só tinha aquele dia, paguei a academia para usar a esteira. Uma vez.
Daquela meia de BC na friaca surgiu uma crise de sinusite. Que eu, naturalmente, negligenciei ("vai passar"), fiz umas mandingas para ver se segurava, o que resultou em eu ainda estar com ela trinta dias depois, e ter que ir ao médico. Ele não achou divertido. Mas até já estava mais no final, pudemos resolver sem antibiótico. 
Até lá, correr com coriza, tosse e dor de cabeça não é super legal, e a velocidade ficou mais uma vez dificultada, porque não vinha o ar. 
Mas, sem mimimi (às vezes com), fiz tudo. Tudooooo.
E o dia foi chegando. 
Realmente, já ter feito a primeira é uma vantagem. Eu sabia o que funcionava e o que não tinha sido tão perfeito da outra vez, na parte nutricional,  por exemplo ficou bem mais ajustado o sistema. 
Já sabia que o Pegasus 36 ia responder tão bem quanto o 35, top ok, cheia dos cremes anti assadura, short Vivian Bogus, meia de compressão, e tudo o mais. 
Era em Floripa, minha casa, e onde fiz o treino de 35km, percorrendo boa parte do percurso da prova.
E eu estava bem determinada. O que nem sempre é suficiente, mas ajuda bastante quem treinou.
Mas uma coisa não mudou: a supresa dos últimos kms. Não tem essa de muro, eu não travo, mas naturalmente, como fui até 35km no treino, lá pelo 38 o cansaço vem forte, e parece que o que te distraía antes não te distrai mais. 
Importante dizer que em nenhum momento eu tenho o pensamento do arrependimento. "por que estou aqui, por que inventei?". Eu escolhi, ninguém me obrigou e, sendo a segunda, nem dá para dizer que não sabia onde estava me metendo.
Me perguntaram no que eu penso nessas quase quatro horas correndo. Olha, além de resolver problemas de aquecimento global, desenvolvimento sustentável, porque na corrida vem só ideia boa, eu penso em TUDO, mas vamos lá: "a  vida das formigas parece muito massa. A vida do vocalista da banda da música da vez, como será que é. Nossa, olha esse cara da frente com uma meia que não combinou com nada. Roots esse meu vizinho. Olha a menina com short soltinho sem as coxas esfregarem, não gosto dela. Também não gosto do senhor,  de 68 anos que me passou sorrindo e disse: vamos, vamos, menina (passou o ódio, ele me chamou de menina, o lindo). Penso em quem está me esperando na chegada, se Arthur colocou o tênis, se está de casaco. No próximo gel, calculando o tempo e km, e a hidratação. No sal. Em quem me ajudou a estar ali, no Diogo, na Ana Paula e na Simone que eu sentia junto de mim o tempo todo. No Mário Lenz e seu apoio de todas as formas, e suas fotos maravilhosas. Droga, passei por um fotógrafo e estava com cara de bunda. Nem vi. Agora já era, cadê o próximo agora que arrumei a postura? no Diogo dizendo que ia dar certo. No meu pai que acha incrível eu correr, e não tem a menor ideia de como é se preparar, e pergunta se chego para o almoço. No vinho que vou tomar à tarde. Afinal, é meu aniversário. No meu aniversário, oba! Correr no aniversário é o máximo mesmo. Eita, cadê a música do Coldplay que não tocou ainda? Próximo gel, já é agora? cadê a placa dos 20km, senhor? Passei? Nas amigas que torcem. Nas que chamam de louca. No Outback, onde vou almoçar depois. No banho antes disso. Ah, como vai ser bom se não arder nada. No mar, lindo, olha que linda que é minha cidade mesmo. Que bom que não tem sol. A ponte parece menor passando de carro, né? Odeio passarela, é pior do que a ponte e não tem vista. Nos caras com cãimbra. Nos caras caminhando ritmo passeio. No cara que me passou no km12 e agora no 34 eu cheguei nele. No cara que eu passei no 18 e agora chegou em mim. Nossa, que corrida torta desse sujeito. A minha também deve estar, deixa arrumar essa passada. Onde disseram que era plana essa prova do carai? Se eu caminhar agora, ainda chego sub 4h. Mas eu não vou caminhar. Será que corro em Pomerode a meia maratona? Nossa, espero estar mais rápida até lá. Abriu o sol, ainda bem que estou chegando. Cadê o Gustavo Maia, será que deu o índice para ele? E a vida das formigas hem? Porra, outro fotógrafo que não vi." 
E aí ó, já se foram muitas horas. 
No caso de Floripa, teve a questão da aferição da distância da prova, que foi muito diferente de todos os GPS de todos os atletas que vi, mas o oficial é o que vale e, segundo os especialistas, todos os gps estavam equivocados mesmo. Sendo assim ou não, sei que o que vale é a prova. 
Mas o que pegou foi o seguinte: da placa do km 19 para a placa do km 20 tinha mais de um km. Tinha. Não havia túnel, não havia nada a tangenciar a não ser o retorno, não havia desvios. Todo mundo relatou a diferença ali. Mas a gente tá doido, ok.
Isso já aconteceu antes, de as placas não corresponderem, sempre, àquilo que estamos vendo no nosso relógio (e no de todos os outros corredores), mas ao final, a distância da prova fecha. Era problema de marcação do caminho, porque quem coloca a placa nem sempre é o mesmo que aferiu. 
Enfim, o que aconteceu é que dali em diante a diferença nunca mais foi resolvida, e eu fiquei esperando. Vejam, era a segunda maratona, eu podia ter pensado que ia dar mais, mas eu simplesmente não acreditava, porque a diferença era muito grande.
Mas quando passei pelo hotel majestic, na volta, eu vi que ia dar mais, porque eu sei a distância entre pontos na beiramar, e sabia que ia passar. E não era pouco. Percebendo isso, tinha que decidir se eu ia tentar acelerar para conseguir o tempo que planejei, ou manter e paciência. Até tentei, mas não tão avidamente, confesso, porque eu tinha forçado a primeira metade, no 28km eu estava forte ainda, correndo bem, e assim fui até o 32, 33, dali em diante é ladeira abaixo, devidamente programada, porque com o lastro que eu tinha até então eu tinha certeza de que ia dar. E ia. No pace que fiz, se a prova tivesse até 42.400 eu ainda fazia abaixo de 3h49, mas deram 42.950, no meu, e com pequenas variações, para mais ou para menos, para outros, mas todo mundo correu pelo menos mais 600m. 
Eu não me preparei para isso. Errei. Tinha que ter me preparado, mentalmente, para a possibilidade, para ter sobrando. Quando apareceu a placa dos 21km, era o que eu deveria ter considerado, e seguir conforme as placas, como me recomendou um senhorzinho,  obviamente mais experiente (e rápido) do que eu. Em Buenos Aires, a distância não chegou a 42.300 no meu relógio, a prova foi muito precisa. Então me programei para a mesma coisa, e virginiana tem a mania do controle. 
E eu me dei conta de que não ia fechar no tempo que queria num momento crucial da prova, porque nos 38km a gente está meio de saco cheio, e dá uma animada de novo no 40 para o 41. Eu só animei quando o Diogo veio ao meu lado no 41 (o treinador), daí ele saiu, e veio o Arthur para fechar a prova comigo. 
A essas alturas, eu tinha abandonado com conviccção a ideia de tentar o tempo, e fui para ser feliz, e terminar sorrindo, de novo, uma maratona bem feita. Estou muito orgulhosa de ter conseguido essa maratona com um ciclo tão diferente do primeiro. Corri em casa, encontrei amigos de corrida, e fui tomar aquele banho maravilhoso para comer e beber feliz com a missão cumprida. Terminei super inteira, que é o mais legal, e comigo não tem o "nunca mais", incrivelmente, mais uma vez, pensei "quando é a próxima?".












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